Enem 2021: Questões citaram ‘Vida de gado’, Chico Buarque, indígenas e escravidão
Itaperuna 21 novembro de 2021
Racismo e escravidão foram abordados em pelo menos cinco questões da prova
No Enem 2021 que teria “a cara do governo” segundo Bolsonaro, as questões trataram de temas que já foram alvo de críticas do presidente e de conteúdos que chegaram a ser censurados em edições anteriores do exame. Entre elas, havia pelo menos duas sobre a situação dos indígenas brasileiros, que abordavam o protagonismo dos povos originários e a relação deles com mineradoras, que são ameaças a áreas de reserva. A prova também problematizou o conceito de “minorias”, com base em texto do filósofo Deleuze, e falou de escravidão e racismo pela música Sinhá, de Chico Buarque, opositor declarado do governo. Ao todo, pelo menos cinco questões foram sobre herança africana e escravidão.
Um dos versos de Sinhá diz: “Estava lá na roça/não sou de olhar ninguém/não tenho cobiça/nem enxergo bem/pra que me pôr no tronco/pra que me aleijar/eu juro a vosmecer/que nunca vi sinhá”.
Ainda sobre escravidão e racismo, foi proposta uma análise a partir da publicidade de um negro foragido e e uma pergunta lembrava dos “tigres”, escravos que eram obrigados a transportar excremento. Durante o período do Império, eram eles que recolhiam e despejavam urina e fezes de moradores da cidade, o que se estendeu por pelo menos 300 anos.
Economista crítico do liberalismo é tema
O cenário econômico não foi esquecido. Uma questão trouxe à discussão o capitalismo sob a ótica de Thomas Piketty, autor do livro “Capital e Ideologia”. Também autor do best-seller “Capital do Século XXI”, com milhões de cópias vendidas no mundo inteiro, Piketty faz críticas ao modelo, alertando para a necessidade de melhoria na distribuição de renda.
Além disso, críticas sociais foram exploradas a partir de músicas. Uma delas, “Comportamento geral”, de Gonzaguinha, que traz a estrofe “Você deve estampar sempre um ar de alegria/e dizer: tudo tem melhorado/você deve rezar pelo bem do patrão/E esquecer que está desempregado”. O mesmo conformismo foi lembrado com “Admirável mundo novo”, de Zé Ramalho, que ficou famosa pelo bordão “vida de gado”, curiosamente alcunha atribuída pela oposição a militantes bolsonaristas.
No entanto, temas atuais como pandemia de coronavírus, que já matou mais de 600 mil mortos no Brasil, e fome – recentemente o total de pobres ultrapassou a marca de 27 milhões de pessoas – foram ignorados. Ao entregarem os cargos, 37 servidores do Inep, responsável pela elaboração e aplicação do Enem, disseram que vinham sofrendo assédio moral da direção do órgão e que eram pressionados a ajustar o conteúdo da prova ao perfil ideológico do presidente.
Fonte: Campos 24 horas