Hipocrisia ou Pandemia?

Itaperuna 16 de fevereiro de 2022

Hipocrisia é uma palavra originalmente usada para qualificar atores que ocultavam a realidade por trás das máscaras. Vem do grego, “hypokrisía” qualificação dos artistas de teatro com habilidade para imitar a fala, fingir gestos e modos de outra pessoa.

Atualmente, hipocrisia é o ato de forjar sentimentos, comportamentos e virtudes que não se possui. Ocorre quando uma pessoa, incapaz de ser verdadeira, simula condutas e exige do outro aquilo que nem ela mesmo possui. Aos poucos esse comportamento se torna um padrão, chegando num nível onde a máscara vira rosto, ficando praticamente impossível separá-los.

Nicolau Maquiavel, no seu livro “O Príncipe”, descreve com genialidade a base do pensamento hipócrita: “Os homens em geral formam suas opiniões guiando-se mais pela vista do que pelo tato, pois a todos é dado ver, mas a poucos é dado sentir. Cada qual vê o que parecemos ser, mas poucos sentem o que realmente somos”.

Maquiavel sugeria o simulacro (representação) como a forma ideal de causar uma boa impressão. Ele contava com a superficialidade da percepção alheia: a maioria não enxerga além do óbvio. Assim sendo, era mais fácil fingir ser aquilo que não é. Mas parece que os ensinamentos de Maquiavel seguem atuais. Muitos lançam mão desse truque para manter uma boa imagem.

Hipocrisia. Esta é uma das palavras que melhor traduz a pandemia do Novo Coronavírus hoje.

Era para a pandemia ser rápida, todos se prepararam para dois, três meses de duração, até porque a própria economia não foi feita para ficar parada por mais tempo.

O brasileiro não tem a cultura de guardar dinheiro para tanto tempo. Nosso dinheiro sequer na média dura 30 dias. E avançamos para uma pandemia de mais dois anos.

E no meio disso tudo o que aconteceu? O aumento da hipocrisia, junto com ela os suicídios.

Pode não ser um tema agradável de se falar, mas é necessário. Ninguém está livre da hipocrisia em seu dia a dia.

Eu por exemplo tentei levar uma vida normal. É claro que evitando certas coisas, principalmente no início da pandemia. Deixei de fazer várias atividades, como receber e ir visitar amigos, frequentar restaurantes e ir ao shopping.

Agora, na sociedade, vejo a hipocrisia em muitos outros lugares. Um exemplo está na extinção de outras mazelas, como se o Coronavírus tivesse matado toda e qualquer outra doença e só sobrasse ele hoje em dia. Os casos de dengue continuam aumentando demais em boa parte do Brasil, ela continua matando muitas pessoas, casos de Chikungunya e Zyka Vírus também estão crescendo e mortes continuam ocorrendo por causa dessas doenças. Mas sobre isso praticamente não se fala mais.

Além do esquecimento dessas outras doenças, há uma outra questão. Eu particularmente conheci umas vinte pessoas bem próximas a mim que se contaminaram por Covid. Felizmente todas tiveram reação de gripe, e nada além disso. A maioria delas respeitou ao máximo o isolamento social e mesmo assim se contaminaram.

Também conheço muitos atropelados, pessoas que morreram por AVC, câncer, que não tem nada a ver com o Coronavírus, mas que foram diagnosticadas com esta doença e ela foi a causa da morte. O porquê desse erro inaceitável ninguém sabe, mas tudo acabou virando Covid.

Em hospitais públicos se vê um verdadeiro caos. Boa parte deles pararam com cirurgias eletivas, disseram que continuam tratando câncer e problemas cardiovasculares mas vemos o aumento de casos de pessoas reclamando que não conseguem atendimento, não conseguem fazer exames, que estão há meses aguardando cirurgia e não conseguem vagas. Parece que só a Covid-19 está sendo tratada, sendo que as pessoas continuam ficando doentes, continuam tendo infarto, tendo câncer, tendo que sobreviver. Entretanto, se a gente for para os hospitais particulares eles estão cheio de vagas.

A hipocrisia também está nos critérios de contágio do Coronavírus. Se é um vírus, é certo que ele é contagioso. O que muda de um vírus para outro são as formas de transmiti-lo e as taxas de transmissão. Mas o contágio é certo. Por isso que não faz sentido as milhares de decisões que foram tomadas em relação às regras de isolamento e distanciamento social.

Veja o caso da reabertura do comércio, lá no início. Alguns puderam abrir, outros não. Algumas cidades afrouxaram as regras e outras ainda restringem a reabertura de muitos estabelecimentos.

Medidas (meio estranhas) foram inseridas para o comércio se manter aberto, mas basicamente tudo estava funcionando como antes. Por exemplo, em Belo Horizonte-MG, o shopping só podia abrir das 11h às 17h. Mas será que não teve um volume maior de concentração de pessoas nesse horário porque você diminuiu o tempo de funcionamento? Ou o vírus contagia só depois das 17h? Sabemos que não é assim, por isso que a hipocrisia quanto a isso reina soberana.

As escolas em grande parte do Brasil ficaram praticamente dois anos de portas fechadas, mas os pais são obrigados a trabalharem presencialmente em transportes públicos abarrotados, não mais em home office. Por que essa diferenciação?

Nesse tempo pandêmico governos tentaram manter as medidas de isolamento e distanciamento social, mas na prática a sociedade já não tem mais condições de respeitá-las. A população precisava de dinheiro e teve que ir para a rua. E então começaram a chamar essa volta de “novo normal”.

Mas essa teoria do “novo normal” já está chata, porque no final todo mundo está tentando voltar ao “velho normal” faz tempo, mesmo que a pandemia ainda não tenha acabado. Na prática o que se vê são as ruas e estradas lotadas. Mesmo com todos os protocolos exigidos ninguém está dando conta de respeitar. Aliás, nem sei se estão tão interessados em respeitar. Na verdade, achamos que está resolvendo um problema mas está criando outro, porque os protocolos só serviram para complicar a cabeça das pessoas e de fato questionar a real necessidade de isolamento e distanciamento social.

Vamos além. Talvez a pandemia serviu para deixar mais claro a desigualdade social do Brasil – e a hipocrisia que lhe dá força. O rico pode falar em ficar em casa, em manter distância, mas o trabalhador não tem essa opção, ele tem que ir para a rua. A classe média fica em casa mas quer a empregada ali, prestando serviço. Ela pode ficar em casa mas ele quer o delivery da sua comida. Assim, o “fica em casa” no final virou uma grande hipocrisia. E só serve para alguns poucos que podem se dar a esse luxo.

Hoje se vive a agonizante e pior parte da HIPOCRISIA, autoridades ditando decretos, recomendações enquanto os mesmos dissipam o vírus em festas, shows, trabalho, social, praias, eventos comemorativos etc. O uso de máscara? Esse caiu por terra faz tempo, onde os poucos que a usam em ambientes que exigem, as usam no queixo. Ela por si só, sem os devidos cuidados de trocar de duas em duas horas, retirar pelas laterais sem o contato próximo ao nariz, dentre outras recomendações já não FUNCIONAM mais.

Dois pesos e duas medidas?

Blog Flávia Pires – Um novo Jeito de Informar

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