CARTA DE UM PROFISSIONAL DE SAÚDE MENTAL À SOCIEDADE
Itaperuna 21 de maio de 2021
A Doença Mental sempre foi motivo de impacto na sociedade e, afastamento da mesma, primeiro foi considerada possessão demoníaca, e como forma de tratar a fogueira e o exorcismo; segundo, entendia-se que o paciente deveria ficar nos “morredouros” lugares isolados esperando a morte como forma de excluir-se mais uma vez, na terceira, precisava-se ficar muito tempo em reclusão, entendendo eu só assim o quadro seria “controlado e disciplinado”, e por último, depois de muita evolução, a Rede de atenção Psicossocial, cujo o indivíduo é tratado em seu território perto da sua família, considerando tudo que foi construído por ele, laços afetivos, sociais, comunitários e familiares, permitindo o sujeito ser quem ele é dentro de uma sociedade e não o excluindo e tendo como consequência a perda da identidade. É por isso que Lutamos. A Reforma Psiquiátrica tem embutida em si uma quebra de paradigmas, que insistem em sobreviver a linha do tempo como: a internação é a melhor opção, o sujeito tem que ser controlado, dentro da instituição ele está mais protegido. Estas crenças fazem com que famílias acreditem que certas condutas é a melhor forma que se tem de tratar, e nós, profissionais de Saúde Mental estamos aqui pra esclarecer que não! O melhor lugar pra se tratar é onde a família está! É preservando a história, os laços, as construções e as redes que se formam para cuidarmos uns dos outros, esta é a proposta, a Saúde Mental ser responsabilidade de todos nós, cidadãos, humanos, espiritualistas, irmãos, profissionais, familiares, amigos, colegas, com a lógica de tratamento onde todos cuidam de todos. Na Pandemia pudemos experimentar o que o isolamento pode fazer conosco e o quanto são valorosas as demonstrações de afeto, elas nos regulam e nos ajudam a enfrentarmos os desafios diários, uns com os outros, onde ninguém larga a mão de ninguém. Quanto mais o sujeito se relaciona mais flexível ele se torna, pois lidar com pessoas diferentes de nós é difícil, mas é necessário!! Inclusive abrirmos nosso coração e nossa mente para lermos este texto sem julgamentos, mas com aceitação. Aceitando que as Doenças Mentais estão em todo lugar, mas só conseguiremos lidar com ela se todos nós estivermos juntos um ao lado do outro começando pelas nossas casas, nossas famílias. Aceitando muitas vezes ela não da em exame, mas que seu termômetro é o sofrimento, e que o sofrimento pode nos guiar a fazer muitas coisas, por isso temos que ter cuidado com o que permitimos crescer em nós, compreendermos que de nada valemos se não pudermos cuidar uns dos outros, e sobretudo, que ninguém escolhe ter uma Doença Mental. Nós profissionais de Saúde Mental, conhecemos muitas lições de vida, de pessoas corajosas que sentam juntamente conosco para lidar com o que os faz sofrer. Entendermos que terapia não é coisa de “doido” e sim de pessoas que buscam superar a si mesmas e vivenciar seus desafios, compreender que não é a grade que faz o sujeito lidar com o que o aflige e sim a oportunidade de pensar no que pode ter contribuído para que ele chegasse aquele lugar, e,,sobretudo, aceitar que a tão esperada “cura” não é deixar de sentir, mas como se lida com o que se sente; não é a ausência de sintomas que indica o quão esta pessoa evoluiu e sim o quanto ela se tornou resiliente frente as suas questões, entender que para desenvolver uma Doença Mental basta ser humano, todos nós podemos desenvolver ao longo da nossa existência, e que se achar melhor que os outros também é delírio, delírio de superioridade, e que fingir que não se percebe ou não tocar em certos pontos fracos não vai impedir que o trauma exista, só aumenta seu ponto cego. O maior dificultador dos profissionais de Saúde Mental não é o quadro que os pacientes apresentam e sim, o estereótipo e o preconceito da Sociedade. Você pode tentar ignorar tudo que leu, mas em algum momento você lembrará de mim, seja num vizinho, num filho, num aluno, num amigo, num familiar, num irmão de igreja, num colega de futebol ou num olhar frente ao espelho, e sempre saiba que eu estarei aqui, pois nós não escolhemos ser profissionais de Saúde Mental, a Saúde Mental é que nos escolhe e por isso lutamos no dia 18 de Maio frente a Luta Antimanicomial, hoje eu, amanhã você, e antes que isso aconteça, lutamos juntos, lado a lado.